Com a pandemia, ainda em 2020, a lei passou a permitir expressamente a realização de reuniões e assembleias digitais. Para isso, as empresas precisam respeitar os direitos de participação, manifestação e demais requisitos legais e ainda seguir a regulamentação específica do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI).
Tanto são permitidas reuniões ou assembleias digitais como também em modo semipresencial, quando há a faculdade de os sócios participarem presencialmente ou então à distância. A participação dos sócios pode ocorrer por meio do envio de um boletim de voto ou por atuação remota, via sistema eletrônico de preferência da sociedade.
A primeira coisa que é importante esclarecer sobre o assunto é que mesmo as assembleias digitais (ou virtuais) devem obedecer às normas gerais de convocação, instalação e deliberação da sociedade limitada e do contrato social. Vale dizer, não é porque a assembleia é digital que se pode convocá-la mediante simples envio de e-mail ou mensagem. Sendo reunião de sócios, isto é, havendo previsão contratual e menos de 10 sócios, seguem-se as regras mais simplificadas que o contrato social dispor, mas, por outro lado, sendo assembleia, é necessário cumprir com todas as formalidades adicionais (incluindo as 3 publicações no diário oficial e em jornal de grande circulação).
O que se tem de diferença em relação à presencial é que a divulgação deve também ser disponibilizada em meio digital seguro e mencionar que se trata da modalidade semipresencial ou digital. A sociedade deve manter os documentos relativos à reunião ou assembleia, incluindo gravação, “pelo prazo aplicável à ação que vise anulá-la”, que, em geral, será de 3 anos a contar do arquivamento da ata de assembleia na Junta Comercial.
Boletim de voto à distância
Conforme já antecipado, a primeira forma de participação dos sócios é o boletim de voto à distância. O documento deve ser disponibilizado pela sociedade contendo todas as informações necessárias, isto é, ordem do dia, orientações sobre o envio, formalidades para que o voto seja considerado válido e indicações de documentos que devem também ser enviados. A ideia é que o boletim seja redigido de forma que o sócio possa somente aprovar, rejeitar ou se abster, indicando o site que contenha informações mais detalhadas.
O boletim deve ser enviado na publicação da primeira convocação e devolvido pelo sócio no mínimo 5 dias antes da assembleia. Em até 2 dias a partir do recebimento do voto, a sociedade deve comunicar se está tudo certo ou se há necessidade de algum ajuste pelo sócio.
Atuação remota via sistema eletrônico
Ainda que não especifique o sistema, exige-se, naturalmente, garantia à segurança, confiabilidade e transparência da assembleia. Conforme informado pelo presidente do DREI, André Luiz Santa Cruz, pelo portal Migalhas, “o sistema pode usar o sistema pode usar tecnologia avançada, com recursos de áudio e vídeo, ou uma tecnologia mais modesta, com um mero chat em que os interessados enviam mensagens de texto, por exemplo”.
É necessário que se tenha o registro de presença dos sócios (o que pode ser feito com base em login e senha), que se preserve o direito de participação e exercício do direito de voto, bem como que seja possível visualizar os documentos apresentados e se manifestar por escrito. Frisa-se a exigência de arquivamento da gravação da assembleia de sócios na sede da sociedade.
Certo, mas pode votar por e-mail ou WhatsApp?
Explicadas as regras, é importante que se entenda que nem a lei e tampouco o DREI especificaram nada sobre isso. Ou seja, partilho da opinião de que tudo é possível desde que atendidos os requisitos que foram descritos acima, sobretudo porque o que se deseja é garantir a identificação dos sócios e que todos recebam a informação a tempo da reunião/assembleia.
A lógica do boletim de voto à distância se assemelha aos formulários que costumamos preencher na internet. Uma vez que se cumpram os requisitos de convocação da lei e do contrato social, entendo que não haja problema algum quanto à forma de envio, inclusive porque o sócio deve devolvê-lo à sociedade com a documentação que permita a sua identificação.
Por sua vez, ficou claro que o sistema eletrônico para a atuação remota pode ser uma “tecnologia mais modesta” com um chat em que os sócios possam deliberar por mensagem de texto. Assim, respeitando as regras de convocação, instalação e deliberação, bem como garantindo o registro de presença dos sócios, pode-se cogitar a sua realização por WhatsApp. O que, por óbvio, não pode é simplesmente se perguntar por mensagem se há concordância com determinada matéria e considerá-la aprovada por assembleia.
Uma preocupação relevante nesse caso é que o sistema seja suficiente para comprovar o registro de presença, tendo em vista que a sociedade pode enfrentar problemas se alguém afirmar que a assembleia não foi válida pela falta de identificação dos sócios. Outra dificuldade que é quanto à convocação em se tratando de assembleia (e não reunião), considerando que a administração precisará publicar em diário oficial e em jornal as informações de como os sócios podem participar e votar à distância.
Note-se, porém, que a regra geral permite dispensar as formalidades de convocação quando todos comparecerem à assembleia (disposição que também parece ser aplicável a reuniões virtuais) ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia. Além disso, as assembleias ou reuniões também podem ser dispensadas se todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto de deliberação social.
De todo modo, quando se exige “por escrito”, o legislador inicialmente imaginou o ato em forma de documento assinado, motivo pelo qual se deve comprovar a identidade do sócio declarante. A melhor forma de fazê-lo é por documento assinado com certificado digital credenciado pelo ICP-Brasil ou pela inclusão dos dados de contato no contrato social, desde que isso se dê mediante alteração por unanimidade de votos.
Essas regras valem para ME e EPP?
Sim, as regras são válidas. Todavia, as microempresas e empresas de pequeno porte possuem regras mais flexíveis para a realização de assembleias, considerando a oportunidade legal de serem substituídas por deliberação que represente 50% + 1 do capital social. Para isso, sobretudo em sociedades com menos de 10 sócios, basta que o contrato social seja redigido de forma técnica e adaptado às necessidades da empresa.
Considerando a dispensa de publicação de atos, a recomendação para as ME e EPPs é que o contrato social contenha regras específicas que possibilitem identificar que a convocação foi realizada (nesse caso, quando a sociedade optar por realizar a reunião ou assembleia de sócios). O que se espera é que as decisões possam ser tomadas com menos burocracia, mas ainda com a segurança de que ninguém foi prejudicado por falta de informação ou por desrespeito a prazos dispostos na lei e no contrato social da empresa.
Ata da assembleia digital ou semipresencial
Na finalização, a ata da reunião ou assembleia poderá ser assinada apenas pelo presidente e secretário da mesa. A cópia da ata deve preencher os mesmos requisitos da assembleia presencial, bem como informar a modalidade digital ou semipresencial (por boletim ou atuação remota), para que possa ser enfim arquivada na Junta Comercial.
Quando a ata não for física, as assinaturas deverão ser feitas com certificado digital por entidade credenciada no ICP-Brasil ou qualquer outro meio de comprovação da autoria e integridade dos documentos, como, por exemplo, tecnologias de biometria digital ou facial, e o presidente da mesa deve declarar o atendimento a todos os requisitos legais.